segunda-feira, 24 de junho de 2024

REVENDO AMIGOS: A GIRA INFINITA EM 8½


Na sequência, outro final possível – obviamente, ao recusar o tempo cronológico, 8½ não poderia terminar exalando ares conclusivos. Guido desiste do filme, se despede da equipe e terá sua última conversa com Daumieur (Jean Rougeul) – personagem que representa o conservadorismo da intelectualidade italiana. Daumieur lhe parabeniza por não realizar o filme, pois, afinal de contas, “já há coisas supérfluas demais no mundo, mais desordem é inútil”. Eles entram no carro e o aparecimento do mago Maurice (Abdalqadir as-Sufi) determina outro momento, outra possibilidade de desfecho: “estamos prontos para começar”, anuncia o mago, e o carrossel do delírio se põe a girar: primeiro, o rosto de Claudia (Claudia Cardinale), de seus pais e avós, de Saraghina (Eddra Gale), e, então, segue-se o cortejo dos personagens, todos de branco, caminhando sem rumo, como que revirando sua alma (“Asa Nisi Masa”), revolvendo a terra morta e trazendo alguma alegria, alguma faísca de felicidade; rapidamente, retorna a confusão, o medo, a dúvida. Mas é deste carrossel de sentimentos que o filme se nutre e se renova, assim como a força e a consciência do personagem central. “Esta confusão sou eu”, brada Guido/Fellini, clamando pela compreensão de sua esposa, Luísa (Anouk Aimée). Ele retoma o megafone e grita: “um momento, deixem que eu dou o sinal!”. Um filme que, como a vida, nasce, morre e renasce na gira infinita de todos os dias. 

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