Uma certa dificuldade em encarar o excesso de gravidade de Cavalo decorria da sensação de ter acessado um outro grau de corporeidade, ainda mais dilatada, em Swinguerra — pois aí o corpo não busca a estabilidade do reconhecimento, mas a conquista, o domínio de uma expressão necessariamente convulsiva, avassaladora. E, por este motivo, o corpo em Swinguerra se impõe de maneira irredutível às figuras mais corriqueiras da representação, de tal modo que a dança vira arma, golpe fatal, exuberância. Aos poucos, Cavalo me fez esquecer a comparação induzida pelo início um tanto esquemático (desnecessária a referência ao mito de Nanã, pois as imagens não mentem). Conforme se abre para um um movimento cada vez mais errático, Cavalo se afasta da aparência de testemunho e instaura um mundo que se move tanto quanto é capaz de mudar de rumo sem perder os traços de conexão. A própria forma do filme revela esse movimento plural, mesclando filmagens de dança, entrevista, registros, no estúdio, na rua, no terreiro, no mangue... A partir de suas articulações aparentemente aleatórias, Cavalo constrói uma guirlanda de vivências em torno da presença mítica da terra e da água. Igualmente mítico é o corpo, cujo movimento fornece a energia que dá a liga e gera a lama do mundo, como nos mostram as imagens de um grupo de pessoas que se banham no mangue. A força aqui não se refere ao domínio, mas ao poder de se habitar a dobra, a hesitação, o rompante. O tempo vai mudar, está mudando.... o trovão, o suor, novamente a lama...
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