Nem tudo o que limita, ou se apresenta como limite, na experiência da "arte" pode ser explicado por uma generalização do caráter funcional da linguagem. Essa experiência extrapola a busca pelo sentido da representação, deslocando-se em múltiplas direções no tempo, no espaço e no espaco-tempo, mas também se infiltrando nas coordenadas da experiência estética.
As passagens que efetuamos de um estado a outro relacionam-se mais aos acoplamentos sensoriais e afetivos do que a uma atividade interpretativa. Arte, enigma transitório.
Pois ao baralhar a percepção estratificada da Estética moderna, os artistas do século XX transformaram a arte em uma articulação entre dispositivos técnicos e conceituais visando a dispor objetos e metamorfoses sobre uma temporalidade indefinida: arte moderna não mais como ready-made (ou como puro retorno/retomada), mas como paródia infinita do ready made: arte-pino de granada (dispositivo), arte-interruptor (deflagração), arte-elemento de conflagração atmosférica (Baile da Gaiola), arte-escultura espaço-temporal (cinema fome zero)...
Esses acoplamentos, por sua vez, relacionam-se mais com a noção de atitude sensorial do que uma experiência estética: a percepção é construtivista e, portanto, trata-se de substituir o caráter passivo da "aisthesis" pela atividade sensorial maquínica.
Atividade sensorial maquínica se define por uma operação estrutural simultânea que se prolonga no tempo por conexão e justaposição de elementos que atravessam um conjunto material ao qual chamaremos diagrama.
É no diagrama que emergem as coordenadas para a sensibilidade e a atitude estética, cada linha "sensorial" trançando conexões entre um plano/fragmento perceptivo (estrutura) e um plano/fragmento maquínico (operação). Como o acoplamento não se dá necessariamente por afinidade, esses planos se confundem na atitude estética.
Modos dos acoplamentos sensoriais:
Acoplamento por localização:
Externo/interno
Alto/baixo
Frente/trás
Direita/esquerda
Movimentos circulares da cabeça, dos quadris, dos membros.
Acoplamento por embaralhamento:
A percepção estética e o papel da imaginação como embaralhadora parcial — imagens pré-sensoriais.
Acoplamento por tensionamento:
Estranhamento/reconhecimento
Acoplamento prático:
interações hápticas diretas pelo toque.
O efeito de deslocamento sensorial decorrente do agenciamento maquínico opera como elemento disparador da atitude estética, importando mais a modulação das cifras sensoriais do que a representação, o "livre jogo das faculdades" ou a própria natureza da percepção.
Arte-circuito de artes-circuitos: não há "encontro" entre obra e espectador ou posição fixa entre o autor e o espectador, mas acoplamento que dispõe a atitude sensorial para um movimento seletivo, e, por vezes, coletivo, de composição.
Atitude estética:
planos-fragmentos articulados por aglutinação, justaposição, ação/reação, etc, deformados por relações de movimento/repouso, aceleração/ralentação, saturação/rarefação...
As interposição de restrições ("contraintes") como atitude vale mais do que a inspiração fabril (a menos que se torne uma cultura técnica) ou o conjunto de procedimentos produzidos ou interditados pelo próprio processo (é disso que se fala quando o artista perde o medo de errar?).
Nenhum comentário:
Postar um comentário